3. E Riobaldo diz da dificuldade de ser bom
“Viver é muito perigoso... Querer o bem com demais força, de incerto jeito, pode já estar sendo se querendo o mal, por principiar. Esses homens! Todos puxavam o mundo para si, para o concertar consertado.”
(GSV, Pg. 16)
Durante muitos anos perguntei, em atendimentos psicoterápicos, quem poderia enumerar 3 pessoas que fossem boas e não fossem bobas. Via de regra a grande maioria das pessoas encontrava muita dificuldade de citar as 3 pessoas. Citavam, mas, ao pensar um pouco melhor, acabavam por descobrir que as pessoas em questão podiam até serem boas, mas também eram bobas, inocentes, de algum modo eram manipuladas em sua suposta bondade.
E nestes anos todos somente 3 pessoas se incluíram na lista dos que eram bons e não eram bobos. E seria de se esperar que muitos o fizessem, uma vez que ser bom é um valor que quase todos almejam. O fato disso não acontecer indica a confusão geral que se faz entre ser bom e ser bobo, ou seja, como os conceitos de bom e bobo estão misturados nas nossas cabeças.
Não é fácil ser bom. A maior parte das vezes quando achamos que estamos sendo bons na verdade estamos fazendo o bem, estamos sendo benfeitores. Podemos iniciar a diferenciação entre esses dois conceitos contrapondo a gratuidade da bondade, que não espera nada em troca, do caráter manipulativo de fazer o bem, onde se espera que o outro fique devendo um favor e fique assim aprisionado em mim, devendo alguma forma de gratidão.
Diante destas colocações fica evidente a importância da passagem bíblica: “...sejais sábios no bem, mas simples no mal.” Romanos, 16:19 No tocante ao mal é simples: se alguém quer lhe fazer o mal, fuja, corra, pique a mula. Mas e diante do bem? É preciso sabedoria. Será se esta pessoa quer fazer o bem ou é de fato boa? Será se eu estou sendo bom ou fazendo o bem?
Neste sentido disse Confúncio: “A maior ofensa que podemos fazer a um amigo é prestar-lhe um favor e o maior dos revides é a ingratidão”.
A pessoa que é realmente boa se admira, cuida de si mesmo, se respeita, se revela, se transforma, se autonomiza. E como consegue ser assim para si mesma pode ser da mesma forma para o outro. A pessoa que é realmente boa quase sempre é chamada de egoísta, porque não faz o bem, não privilegia as cumplicidades e não se sente presa a gratidões alheias. Mas, ao ser chamada de egoísta, uma pessoa que é boa não se abala, pois sabe-se, e não tem medo de parecer egoísta. A pessoa que é boa é serena, é inquieta e esperançosa diante das incertezas da vida.
A pessoa que faz o bem é ansiosa, agitada e aflita, na ânsia de salvar o outro para provar seu valor.
Ou seja, nas palavras de Rabindranath Tagore, no seu texto Pássaros Perdidos: “Quem se ocupa demasiado em fazer o bem não dispõe de tempo para ser bom.”
Ou, se alguém quer realmente ser bom basta seguir a sugestão de Santo Agostinho: “Ama e faz o que quiseres”.
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